CONSELHO NACIONAL DE SAÚDE

 

RESOLUÇÃO Nº 304 DE 09 DE AGOSTO DE 2000

 

 

O Plenário do Conselho Nacional de Saúde, em sua Centésima Reunião Ordinária, realizada nos dias 09 e 10 de agosto de 2000, no uso de suas competências regimentais e atribuições conferidas pela Lei nº 8.080, de 19 de setembro de 1990, e pela Lei nº 8.142, de 28 de dezembro de 1990, e Considerando:

  • A necessidade de regulamentação complementar da Resolução CNS nº 196/96 (Diretrizes e Normas Regulamentadoras de Pesquisas Envolvendo Seres Humanos), atribuição da CONEP conforme item VIII.4.d da mesma Resolução, no que diz respeito à área temática especial “populações indígenas” (item VIII.4.c.6).

Resolve;

  • Aprovar as seguintes Normas para Pesquisas Envolvendo Seres Humanos – Área de Povos Indígenas.

 

I – Preâmbulo

A presente resolução procura afirmar o respeito devido aos direitos dos povos indígenas no que se refere ao desenvolvimento teórico e prático de pesquisa em seres humanos que envolvam a vida, os territórios, as culturas e os recursos naturais dos povos indígenas do Brasil. Reconhece ainda o direito de participação dos índios nas decisões que os afetem.

Estas normas incorporam, as diretrizes já previstas na Resolução 196/96, do Conselho Nacional de Saúde, e fundamenta-se nos principais documentos internacionais sobre direitos humanos da ONU, em particular a Convenção 169 sobre Povos Indígenas e Tribais em Países Independentes e Resolução sobre a Ação da OIT- Organização Internacional do Trabalho – Concernente aos Povos Indígenas e Tribais, de 1989,da Constituição da República Federativa do Brasil ( Título VIII, Capítulo VIII Dos Índios ) e de toda a legislação nacional de amparo e respeito aos direitos dos povos indígenas enquanto sujeitos individuais e coletivos de pesquisa.

As pesquisas envolvendo comunidades ou indivíduos indígenas devem corresponder e atender às exigências éticas e científicas indicadas na Res. CNS 196/96 que contém as diretrizes e normas regulamentadoras de pesquisas envolvendo seres humanos e suas complementares. Em especial deve-se atender também à Resolução CNS 292/99 sobre pesquisa com cooperação estrangeira, além de outras resoluções do CNS sobre ética em pesquisa, os Decretos 86715 de 10/12/81 e 96830, de 15/01/90 que regulamentam o visto temporário para estrangeiros.

 

II – Termos e Definições

A presente resolução adota no seu âmbito as seguintes definições:

1 – Povos Indígenas – povos com organizações e identidades próprias, em virtude da consciência de sua continuidade histórica como sociedades pré –colombianas.

2 – Índio – quem se considera pertencente a uma comunidade indígena e é por ela reconhecido como membro.

3 – Índios Isolados – indivíduos ou grupos que evitam ou não estão em contato com a sociedade envolvente.

 

III – Aspectos Éticos da pesquisa envolvendo povos indígenas.

As pesquisas envolvendo povos indígenas devem obedecer também aos referenciais da bioética, considerando-se as peculiaridades de cada povo e/ou comunidade.

1 – Os benefícios e vantagens resultantes do desenvolvimento de pesquisa, devem atender às necessidades de indivíduos ou grupos alvo do estudo, ou das sociedades afins e/ou da sociedade nacional, levando-se em consideração a promoção e manutenção do bem estar , a conservação e proteção da diversidade biológica, cultural, a saúde individual e coletiva e a contribuição ao desenvolvimento do conhecimento e tecnologia próprias.

 

2 – Qualquer pesquisa envolvendo a pessoa do índio ou a sua comunidade deve :

2.1 – Respeitar a visão de mundo, os costumes, atitudes estéticas, crenças religiosas, organização social, filosofias peculiares, diferenças lingüísticas e estrutura política;

2.2 – Não admitir exploração física, mental, psicológica ou intelectual e social dos indígenas;

2.3 – Não admitir situações que coloquem em risco a integridade e o bem estar físico, mental e social;

2.4 – Ter a concordância da comunidade alvo da pesquisa que pode ser obtida por intermédio das respectivas organizações indígenas ou conselhos locais, sem prejuízo do consentimento individual, que em comum acordo com as referidas comunidades designarão o intermediário para o contato entre pesquisador e a comunidade. Em pesquisas na área de saúde deverá ser comunicado o Conselho Distrital;

2.5 – Garantir igualdade de consideração dos interesses envolvidos, levando em conta a vulnerabilidade do grupo em questão.

 

3 – Recomenda-se, preferencialmente, a não realização de pesquisas em comunidades de índios isolados. Em casos especiais devem ser apresentadas justificativas detalhadas.

 

4 – Será considerado eticamente inaceitável o patenteamento por outrem de produtos químicos e material biológico de qualquer natureza obtidos a partir de pesquisas com povos indígenas.

 

5 – A formação de bancos de DNA, de linhagens de células ou de quaisquer outros materiais biológicos relacionados aos povos indígenas, não é admitida sem a expressa concordância da comunidade envolvida, sem a apresentação detalhada da proposta no protocolo de pesquisa a ser submetido ao Comitê de Ética em Pesquisa – CEP e à Comissão Nacional de Ética em Pesquisa – CONEP, e a formal aprovação do CEP e da CONEP;

 

6 – A não observância a qualquer um dos itens acima deverá ser comunicada ao CEP institucional e à CONEP do Conselho Nacional de Saúde, para as providências cabíveis.

 

IV- O protocolo da pesquisa

O protocolo a ser submetido à avaliação ética deverá atender ao item VI da Resolução 196/96, acrescentando-se:

1 – Compromisso de obtenção da anuência das comunidades envolvidas tal como previsto no item III § 2 desta norma, descrevendo-se o processo de obtenção da anuência.

2 – Descrição do processo de obtenção e de registro do Termo de Consentimento Livre e Esclarecido – TCLE , assegurada a adequação às peculiaridades culturais e lingüísticas dos envolvidos.

 

V – Proteção:

1 – A realização da pesquisa poderá a qualquer tempo ser suspensa, obedecido o disposto no item III.3.z da Resolução 196/96, desde que:

– 1.1. seja solicitada a sua interrupção pela comunidade indígena em estudo;

1.2. a pesquisa em desenvolvimento venha a gerar conflitos e/ou qualquer tipo de mal estar dentro da comunidade;

1.3. haja violação nas formas de organização e sobrevivência da comunidade indígena, relacionadas principalmente à vida dos sujeitos, aos recursos humanos, aos recursos fitogenéticos, ao conhecimento das propriedades do solo, do subsolo, da fauna e flora, às tradições orais e a todas as expressões artísticas daquela comunidade.

 

VI – Atribuições da CONEP

1 – Dentro das atribuições previstas no item VIII.4.c.6 da Resolução CNS 196/96, cabe à CONEP, após a aprovação do CEP institucional, apreciar as pesquisas enquadradas nessa área temática, ainda que simultaneamente enquadradas em outra.

2 – Parecer da Comissão Intersetorial de Saúde do Índio(CISI), quando necessária consultoria, poderá ser solicitado pela CONEP.

3 – Os casos omissos referentes aos aspectos éticos da pesquisa, serão resolvidos pela Comissão Nacional de Ética em Pesquisa.

 

 

JOSÉ SERRA

Presidente do Conselho Nacional de Saúde

 

Homologo a Resolução CNS nº 304, de 10 de agosto de 2000, nos termos do Decreto de Delegação de Competência de 12 de novembro de 1991.

 

JOSÉ SERRA

Ministro de Estado da Saúde